O centrista Emmanuel Macron, 39, foi eleito presidente da França neste
domingo (7) com 65,1% dos votos, segundo as primeiras estimativas, que
ainda serão confirmadas durante as próximas horas.
Representando o movimento independente Em Frente!, ele governará pelos
próximos cinco anos a sétima maior economia do mundo e um dos cinco
países com direito o veto no Conselho de Segurança da ONU.
Macron disputava as eleições, com impacto no restante da União Europeia,
contra a ultranacionalista Marine Le Pen, da Frente Nacional, que
recebeu 34,9%.
O impacto imediato será o reforço do projeto de integração europeu, do
qual ele é um entusiasta. Le Pen defendia erguer barreiras
protecionistas, retirar a França do bloco econômico e possivelmente
retomar o franco como moeda, em vez do euro.
A eleição de Macron, comemorada por militantes diante do Museu do Louvre, marca ademais transformações históricas no país.
Esta foi a primeira vez em que os dois principais partidos franceses
-socialistas e republicanos- não concorreram no segundo turno. É também a
primeira vitória de um candidato sem a estrutura de uma sigla
tradicional.
Ele será o presidente mais jovem desde a eleição em 1848 de Luís Napoleão, sobrinho de Napoleão, aos 40.
O movimento Em Frente!, de Macron, foi fundado há um ano nos moldes de
uma start-up, assentado em uma rede de 260 mil militantes, parte deles
inexperientes.
A uma população desencantada com a atual divisão entre direita e
esquerda, buscou se vender como alguém além dessa divisão. Acena ora com
o afrouxamento das leis trabalhistas, que deverá ter dura oposição dos
influentes sindicatos, ora com medidas de proteção social, tema caro aos
franceses.
Biografia
Macron personifica uma versão bastante específica da renovação política.
Ele é até certo ponto um candidato contrário ao establishment, mas
simultaneamente representa esse mesmo sistema.
Ex-filiado ao Partido Socialista, o novo presidente foi, afinal,
ministro da Economia do impopular governo de François Hollande, tendo
abandonado o barco só em agosto do ano passado.
O presidente eleito dificilmente poderá se apresentar como mais um entre
a população. Ele outrora trabalhou para o banco Rothschild, em que
recebeu 2,8 milhões de euros (equivalente a R$ 10 milhões) de 2008 a
2012.
Macron foi formado, também, em uma instituição que é símbolo da elite: a
ENA (Escola Nacional de Administração), por onde passaram os
presidentes Jacques Chirac e François Hollande e os principais nomes da
administração da França, quer seja à esquerda ou à direita.
Ele será acompanhado nos próximos cinco anos no Palácio do Eliseu por
sua mulher, Brigitte Trogneux. O casamento é alvo de interesse já há
algum tempo. Brigitte é 24 anos mais velha do que ele, e ambos se
conheceram quando ela era professora em sua escola.
Fissuras
A eleições deste ano evidenciaram diversas fissuras na sociedade francesa, ampliadas pela lupa com que foram vistas pelo mundo.
A candidatura de Marine Le Pen, representando um partido populista com
histórico de retórica antissemita, assustava a liderança europeia após a
eleição do republicano Donald Trump nos EUA e a decisão do Reino Unido
de deixar a UE, conhecida como "brexit".
A divisão dos eleitores entre ambos os candidatos é sinal de uma série de temas sobre os quais discordam.
Macron e Le Pen têm, por exemplo, visão distintas da União Europeia: ele
a favor e ela contra. Eles também enxergam a imigração de maneiras
diferentes: ele quer uma sociedade mais multicultural, enquanto ela quer
interromper o fluxo e expulsar migrantes condenados e suspeitos de
radicalização.
Há também distinções mais estruturais, como a tendência, comprovada por
pesquisas, de que o eleitorado de Macron tenha uma expectativa mais
otimista em relação ao futuro, em comparação com o de Le Pen.
A base de Macron é descrita por analistas como a dos "vencedores da
globalização", aqueles que se beneficiaram da integração à economia
mundial. Le Pen representa, por outro lado, as periferias e pequenas
cidades onde o fechamento de fábricas destruiu empregos. O desemprego na
França está hoje em cerca de 10%.
Futuro
Recém-eleito, Macron ainda não pode relaxar na cadeira de presidente.
Ele enfrenta já em junho as eleições legislativas que darão o tom geral
de seu governo. Sem a maioria dos legisladores, será complicado aprovar
as reformas que propõe.
Será determinante, agora, quanto apoio virá dos tradicionais Partido
Socialista e Republicanos, que ele derrotou já no primeiro turno.
As duas siglas se uniram em torno da candidatura dele contra Le Pen
neste domingo, apoiando publicamente o candidato, mas não
especificamente por concordar com sua plataforma.
A adesão à campanha de Macron foi vista como maneira de impedir Le Pen
de chegar até a Presidência. Não é a primeira vez em que o establishment
francês lança mão dessa estratégia.
Em 2002, quando o pai de Le Pen concorreu ao cargo, formou-se também a
chamada "frente republicana" para freá-lo. Assim, o conservador Jacques
Chirac venceu com 82% dos votos contra Jean-Marie Le Pen, pai de Marine.
O resultado superior da candidata da FN neste ano mostra que, apesar da
derrota, o partido ultradireitista avança em sua estratégia de se
"normalizar" aos olhos do eleitorado francês, afastando membros mais
radicais.
Seu potencial de se tornar a principal voz crítica à globalização do
país e se cacifar para um desempenho melhor no pleito de 2022 aumentará à
medida em que o governo Macron não dirimir o desemprego e o lento
crescimento de sua economia.
Estudioso da Frente Nacional, o cientista político Stéphane Wahnich, da
Universidade Paris-Est Créteil, diz que o crescimento da base de votos
dela sinaliza a progressiva vontade do eleitorado de revirar a política.
Ele argumenta que Le Pen ainda esbarra na história de seu partido e em
sua falta de credibilidade econômica, mas que há potencial para o
surgimento de outro candidato antissistema e populista, pois o conceito
está se tornando cada vez mais "respeitável" para a população.
"O problema de Marine Le Pen é se chamar Le Pen."
Folhapress
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